QUARTEL DE SANTA ANA E DESTACAMENTO DO INDAIÁ NO PORTO DOS PINTORES.
A região do Gamelão, entre os atuais municípios de Abaeté e Cedro do Abaeté, nas encostas da Serra da Saudade, era rota do caminho que ligava o Quartel Geral até um dos principais pontos de garimpo do Rio Indaiá: o Porto (ou passagem) dos Pintores. Foi devido a esta localização que no fim do século XVIII se instalou ali uma casa de guarda, com um pequeno destacamento de militares para impedir o fluxo de garimpeiros ilegais para o Indaiá, bem como ser uma base para a cavalaria regular. A região era ocupada por soldados, pois por ali passavam os regimentos de cavalaria. Havia pouquíssimos moradores naturais daquele lugar, por ser um sertão ermo e anteriormente frequentado apenas por aventureiros.
Com o passar do tempo foram sendo construídos destacamentos para as tropas de cavalaria fazerem a guarda desses rios. A base da cavalaria regular nessa região era o Quartel-Geral do Indaiá (construído em 1791, ampliado em 1801) ao qual pertenciam os presídios de Santana (nas cercanias de Cedro do Abaeté, próximo a fazenda Santa Ana), Palmeiras, do Ferreiro, Argões (ou Aragões), Assunção (abaixo do da barra do ribeirão dos Tiros) Cachoeira Mansa (ou Bonita) e São João da Boa Vista (este entre as cabeceiras do ribeirão dos Veados e do ribeirão Marmelada - atualmente chamado de Quartel São João). Recebeu este nome em devoção aos avós de Jesus.
Relatos:
"Aos treze dias do mês de setembro de mil oitocentos e oito anos, neste quartel geral do Indaiá e casas de residência do caixa da real extração diamantina do Abaeté ou Lorena; Doutor Diogo Pereira Ribeiro de Vasconcelos, onde eu escrivão me achava. Sendo aí presentes Claudiano Manoel da costa Reys e seu irmão Antonio da Costa Chaves Rey; foi mandado pelo dito caixa que despejassem da demarcação para nela não mais entrarem pela suspeita que contra eles resultou de terem pedido licença para ir a tropa diamantina do Indaiá. E atentado que cometerão sendo lhe delegada de ir um deles Claudiano Manoel até o quartel de Santa Ana próximo duas legoas a dita tropa [e] nele entrar o outro Antonio da Costa Chaves. No outro fim pelo que também contra ambos resulta de sedutores de dois escravos pertencentes a seu pai Manoel José Chaves fugidos daquela tropa no mesmo dia em que eles saíram do quartel de Santa Ana. Com as penas do caso de tornarem a entrar na demarcação impostas aos extraviadores e contrabandistas além das do capítulo décimo quarto do regimento diamantino fulminadas contra os que desobedecem as regras dos termos nele decretados. O que eles quando por se de boa mente se sugeitaram a assinarem o presente termo de baixo às penas comminadas Daqui para constar mandou lavrar o dito caixa o presente termo no que se assina com os ditos despejados depois de lhe ser lido pelos mesmos.
Matheus Alberto de Souza Oliveira Castro
Escrivão da Caixa e Diamantes
Assinam: Claudiano Manoel da Costa Reys
Antônio da Costa Chaves"
Um inventário de um soldado do destacamento do Indaiá:
O Quartel de Santa Ana era referência para o destacamento dos Pintores. Com a morte de um oficial, o comandante do destacamento devia assinar o inventário dos bens do falecido. Neste interessante documento vemos os bens de um oficial que servia no Indaiá.
"Inventário feito dos bens do falecido Lourenço Jose Justiniano soldado da quinta companhia por mim Cadette Manoel José Vilella de Carvalho como escrivão perante o comandante do destacamento, o quartel mestre José de Deus Lopes como auditor cujos bens se entregarão a mulher do falecido neste destacamento do Indaiá aos vinte e três dias do mês de Julho de mil oitocentes e dez anos."
Dentre os bens do falecido vê -se: "Uma farda velha, calças azuis e brancas velhas (de algodão e xita), uma barretina com plumas e uma mala muito velha."
Na relação do armamento da quinta companhia ao qual pertencia ao falecido Lourenço Justiniano vemos o seguinte: "Uma clavina, uma pistola perfeita, uma espada, além de uma cabeçada com seu freio. Cujo o armamento conduz o soldado Antônio Joaquim de Melo e o cavalo pertencente ao mesmo Falecido. Quartel Geral do Indaiá, 08 de Outubro de 1810"
Assinam o documento o cadete Manoel José Villela e o Comandante José de Deus Lopes.
Decadência:
A função do Quartel de Santa Ana foi extinta assim que findou a Real Extração, como vemos neste documento passado por Diogo de Vasconcelos ao governador Pedro Xavier :
"Os quartéis de Santa Anna e de do São João desviados do Rio Indaiá aquele quase três legoas e este legoa e meia são inteiramente inúteis de sorte que com a faculdade de Vossa Excelência, me pareceu e ao mencionado Quartel Mestre extingui-los, deixando a cargo deste o aproveitamento da telha"
Em 1819, não restava nada além de ruínas do Santa Ana, devido a extinção do destacamento. Isso se deu após a interrupção da Real Extração Diamantina, em 1808, como podemos ver no seguinte documento transcrito:
"Bem como o quartel de S; Anna, cuja guarda sendo também abolida se vai igualmente arruinando.[...] os soldados estacionados na guarda de Pintores, dessa se acham inteiramente desabrigados por estarem em pequenos ranchos e muito arruinados de maneira que não poderão existir ali nas águas futuras, me persuadi que deveria representar a V. Magestade para que seja conveniente me mande ordem para fazer avaliar, "rematar"? as ditas casas, e o resultado delas, fazer-se quarteis para aqueles soldados, podendo-se remover a telha, portas e janelas do de Santana que fica com distância proporcionada para a fatura do de Pintores. Quartel Geral do Indaiá, 17 de Julho de 1819. José Batista Franco"
O Comum de Santa Ana:
Com o passar do tempo, todas aquelas terras próximas à margem direita do Indaiá eram chamadas "Comum de Santa Ana". Comum, no termo antigo significa "que pertence a todos; geral, coletivo, público". Até hoje é possível ver este termo nas escrituras referentes a Cedro do Abaeté.
Além disso, o comandante José de Deus Lopes adquiriu sesmaria próximo do Quartel e fundou uma fazenda de mesmo nome. Esta fazenda Santa Ana foi depois do seu genro, Antonio Zacarias Álvares da Silva, o barão do Indaiá.
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