CARTA/DENÚNCIA DO BARÃO DE ESCHWEGE A RESPEITO DA SITUAÇÃO FUNDIÁRIA ENTRE O RIO INDAIÁ E O RIO ABAETÉ

 

"1818

As muitas queixas e representações que me tem sido dirigidos pelos moradores do Certão do Abaeté, por causa de terras que possuem e que não possuem à força de tomadas por um ou outros sempre que lhes pareção serem suas,  pedindo-me aqueles moradores a decisão de taes contendas e que por várias vezes tenho obtido com satisfação de ambas as partes, me obrigão à levar a presença de V. S. a seguinte representação.

Desde a descoberta dos diamantes no Certão do Indaiá e Abaeté, e desde que ele foi guardado por destacamentos a fim de se negar a entrada não só dos garimpeiros como a de quaisquer outras pessoas, se introduziu um abuso que até hoje se tem conservado. Exercitaram os Comandantes daqueles destacamentos uma jurisdição ilimitada, conservando os povos vizinhos por meio de terror em um desrespeito para com eles, de modo que por maiores violências e ladroeiras que os comandantes lhes fizeram, ninguém se atrevia a queixar-se deles. Podendo deste modo dizerem-se senhores de muitos centos de légoas quadradas de campinas e matos, com o tesouro dos diamantes nos rios, uns se deliberão a possuir terras, outras a vender os rios aos garimpeiros.

A primeira cultura das terras foi feita com o pretexto de sustentar o destacamento e quem o fez chamou logo aquelas terras suas, apossando-se de muitas légoas em circunferências e depois lembrarão-se dos parentes, e alcançarão finalmente cartas de sesmarias de muitas terras no distrito Diamantino entre os rios Indaiá e Abaeté. Em consequência destas cartas que (?) anularão as primeiras ordens de não haver entrada naquele sertão diamantino, ficarão mais orgulhosos os Comandantes que julgando-se inteiramente senhores do certão, expedião graças, proibião toda a entrada nele, escolhião as melhores terras para si e as vendião negociando com os que melhor lhes podião pagar. Grande parte dos soldados que se souberão conservar effetivos naqueles destacamentos gozarão conjuntamente com o Comandante dos mesmos privilégios, por eles criados para si de se apossar das terras, negociá-las com os homens mais pobres que desejavão arranchar-se com suas numerosas famílias na terra e houve comandantes a quem se pagavão as licenças para se entrar no distrito diamantino com o fim de se apossar de algumas terras.

Deste modo todo aquele certão, excetuando um pequeno distrito ao pé da Mina da Galena conta já os seus possuidores, mas poucos moradores. Entre os rios Indaiá e Abaeté há sesmarias de seis , nove e quinze légoas com dezoito anos de data e ainda sem nem habitantes quando com outras partes onde não há sesmarias como é na margem esquerda do Abaeté há alguns moradores e todos possuem legoas de terra, mas porque as terras possuídas não forão medidas e as sesmarias o forão à olho, há continuadas desordens entre aqueles possuidores das terras, desordens que jamais serão decididas ou pela grande distância em que os contadores estâo do juiz sesmeiro ou pela parcialidade e ignorância de algum comandante.

Portanto, o interesse d’aqueles distritos exige que se retomam em consideranções os artigos seguintes.

1º Decidir-se por uma nova ordem, se os comandantes dos destacamentos podem ou não proibir a entrada de novos colonos naqueles territórios.

No estado atual a meu ver não há razão alguma negar-se este beneficio a toda a pessoa que pretende cutivar e labutar as terras que se queixa apossar, pois que há muito segundo mostrei que já ali habitão – e se com efeito existe algum motivo que obste a entrada de novos colonos, para que as ordens sejão consequentes, será preciso fazer sair do distrito os que ali estão estabelecidos, medida esta que virá a maior das crueldades. Para tudo se poder conciliar, é necessario determinar.

 

2º Que todos os possuidores de sesmarias entre os rios Indaiá, e Abaeté com o seu braço do sul denominado Vêrra tornem a fazer de novo a medicção de suas semarias as quais não devem exceder a tres legoas conforme as reais determinações.

 

3º Que a todos os que se quizerem arranchar e morar na estrada que conduz do Quartel dos Pintores à Mina da Galena, não sendo os proprietários das mesmas terras, se dê meia legoa de terra para ambos os lados da estrada e uma legoa no seu comprimento.

 

4º Sendo a maior parte das pessoas que habitão e querem ir habitar aquele certão homens pobres, carregados de filhos, sem possuir escravos nem ter maior para fazer a despesa com as cartas de sesmarias, e a medicção de terras são remotas, para os animar a fazê-la aos comandantes dos distritos como se tem feito aos comandantes das divisoes, o poder conceder e demarcar as terras, segundo sua exporte sem que possão por motivo algum tirar vantagem de taes trabalhos.

 

5º Para as terras que estão a margem esquerda dos rios Verra e Abaeté ficarão sob a Inspeção do Inspetor da Real Mina da Galena, dando-se e demarcando-se o terreno que os novos colonos possuem e queirão possuir, devendo com tudo ficar em distâcia compativel com a extensão que exige o estabelecimento da Real Mina .

 

6º Todas as terras possuídas e não cultivadas nem povoadas, serão declaradas devolutas. Os comandantes dos destacamentos assim como o Inspetor da Real Mina só poderão conceder terras para serem cultivadas impondo ao Colono logo que as demarcar a obrigação de as cultivar e povoar no espaço de um ano, findo ester prazo sem que elles hajão preenchido aquela condição ficará de nenhum efeito a concessão feita e a terra declarada devoluta.

7º Conforme forem as forças de um novo colono ou as de uma numerosa familia, assim lhe será concedido de uma até três legoas quadradas de terreno compreendendo campo e mato. Cada um comandante, bem como o Inspetor da Real Mina, terá um livro próprio em que seja lavrada com toda a clareza e individação a demarcação das terras concedidas aos colonos de um distrito não só para servirem a estes como títulos de legítima possessão, mas também para saberem quais podem ser novamente dadas por se haverem declarado devolutas.

Assim se evitarão todas as desordens entre aqueles moradores, e a S. M. resultará uma grande vantagem, avançando a cultura de Algodão para que são tão próprias aquelas terras que o produzem de uma qualidade superior, como a de Minas Novas.

Vila Rica, 7 de Fevereiro de 1818.

Guilherme Barão de Eschwege."






Fonte: 

1 - Arquivo Público Mineiro - CC - CX. 89 - 20289 doc 05 (1)


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